Criança que não recebe carinho da mãe pode ter cérebro menor e menos desenvolvido
A forma como o bebê é tratado pela mãe nos seus primeiros anos de vida
poderá determinar se seu cérebro terá um bom funcionamento. Uma pesquisa da
Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA) comparou os cérebros de duas
crianças de três anos de idade: de um lado, bem tratada por seus familiares,
principalmente pela mãe; e de outro, negligenciada. O resultado da pesquisa
mostrou que no caso da mãe que deu amor, carinho e se comportou como totalmente
responsável pelo bebê, o cérebro dele cresceu plenamente. Enquanto que no caso
oposto, quando a criança sofreu abuso ou foi maltratada, o cérebro mostrou-se
menor e com pontos mais escuros, indicando que é menos desenvolvido.
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Crianças que recebem mais carinho podem se desenvolver melhor |
— O desenvolvimento do circuito cerebral depende potencialmente de uma
interação positiva entre a mãe e o bebê — apontou o professor do Departamento
de Psiquiatria e Ciências Comportamentais da UCLA, Allan Schore, ao jornal
britânico “The Telegraph”.
De acordo Schore, isto ocorre porque 80% das células cerebrais se
desenvolvem na faixa dos 2 anos de idade, e se o processo de formação de
conexões (sinapses) for prejudicado ou não for estimulado, o déficit poderá ser
permanente. Ele ressalta que o bebê maltratado poderá ter sua inteligência
afetada. Além disso, poderá crescer com menos empatia para com outras pessoas,
mais propensão a ser viciado em drogas e a se envolver em crimes violentos. Ele
ainda terá mais chances de ficar desempregado com frequência e de ter problemas
de saúde e mentais. Esta descoberta, segundo o pesquisador, poderia ser um dos
fatores a explicar, por exemplo, por que algumas gerações de famílias tendem a
enfrentar um ciclo difícil de quebrar de falta de escolaridade, desemprego
persistente, pobreza, vícios como o de álcool e drogas, assim como o envolvimento
em crimes.
Maior risco de ansiedade e depressão
Em janeiro deste ano, a Escola de Medicina da Universidade de Washington
publicou o primeiro estudo mostrando mudanças na anatomia cerebral no caso de
crianças que tinham sido negligenciadas por seus pais. A pesquisa, publicada no
periódico “Proceedings of the National Academy of Sciences” (Pnas), apontou que
crianças que foram bem cuidadas por suas mães nos primeiros anos de vida tinham
o hipocampo do cérebro maior. Essa estrutura é fundamental para o aprendizado,
a memória e a resposta ao estresse. Neste estudo, os pesquisadores analisaram
as imagens dos cérebros de 92 crianças, revelando que aquelas que tinham
recebido afeto e sido bem alimentadas tinham o hipocampo 10% maior que as
crianças cujas mães tinham sido negligentes.
Chefe da psiquiatria infantil da Santa Casa do Rio de Janeiro, Fábio
Barbirato lembra que desde o século XVII estudos vêm tentando relacionar o
desenvolvimento cerebral com o carinho dos pais. Ele lembra que já em 1621 o
médico americano Richard Button apontou que crianças negligenciadas tinham mais
propensão a sofrer de depressão e ansiedade. Barbirato diz que que os trabalhos
ainda são inconclusivos, mas que este é um conhecimento já intuitivo da
comunidade científica.
— Nada foi de fato comprovado, porque os estudos são ainda pouco amplos,
foram feitos com um número reduzido de pacientes. Mesmo assim, na prática
clínica, isto já é verificado. E em palestras já costumamos ressaltar para as
mães a importância de cuidar bem de seus filhos — explicou Barbirato. — A nossa
preocupação é, por exemplo, com as mães usuárias de crack ou com as crianças
que perderam os pais.
Segundo o psiquiatra, a criança que não for bem tratada poderá, no
futuro, apresentar, além de depressão e ansiedade, dificuldade de aprendizado e
de relacionamento com outras pessoas. Barbirato explica que até os 5 anos o
córtex pré-frontal ainda não está totalmente formado. E a falta de estímulos,
como o carinho, pode prejudicar este crescimento.
— Até esta idade, estão se formando muitas sinapses no córtex
pré-frontal. E seu desenvolvimento precisa de estímulos, que vêm do afeto —
afirmou.
Fonte: O Globo